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“Rótulos não abarcam tudo”
O dia 29 de agosto marca o Dia Nacional da Visibilidade Lésbica. Desde a escolha da data, durante o I Senale (Seminário Nacional de Lésbicas), realizado em 1996, a visibilidade a este segmento tem sido a palavra-chave. Para tanto, são realizadas no Brasil diversas atividades, incluindo seminários e caminhadas, visando resgatar a luta das lésbicas e bissexuais nos movimentos feministas, mistos e LGBT, denunciar o sistema patriarcal que oprime as mulheres e a heteronormatividade como norma e padrão da sociedade. A luta contra o patriarcado continua sendo o principal ponto da agenda do movimento de mulheres lésbicas e bissexuais, na análise de uma de suas pioneiras – Yone Lindgren, vice-presidente da Associação Brasileira de Gays, Lésbicas, Bissexuais, Travestis e Transexuais (ABGLT) e militante do Movimento Dellas, um dos principais grupos que atuam no Rio de Janeiro. “Somos mulheres e sofremos um grande desgaste com o machismo em nossa cultura, responsável pela lesbofobia e pela violência contra todas as mulheres. Claro que, junto a isto, queremos emprego, moradia, educação e tudo mais que uma população merece, sem preconceitos”, avalia Yone, que iniciou sua carreira de militante em 1978. A data foi pensada, lembra ela, como oportunidade de se pensar em alternativas políticas para uma situação que ainda não favorece as mulheres, especialmente quando estas, no lugar de seguirem o caminho do casamento, marido e filhos, optam por assumir uma relação homossexual. “Achei o máximo quando soube que na Austrália abriu-se a possibilidade de não se registrar mais o gênero da pessoa em documentos. Se não há gênero, não há discriminação relacionada à sexualidade ou à orientação sexual”, sustenta. De fato, em março deste ano, a Austrália tornou-se o primeiro país do mundo a reconhecer uma pessoa sem gênero definido, quando o governo do Estado de New South Wales emitiu a Norrie May-Welby, ativista do grupo Sex and Gender Education (Sage), uma certidão de “Gênero Não-Específico”. As autoridades, assim, reconheceram sua pessoa como não sendo nem homem nem mulher, direito pelo qual May-Welby vinha lutando há anos. Registrada ao nascer como do sexo masculino, aos 23 anos submeteu-se a tratamentos hormonais e iniciou procedimentos médicos para cirurgia de redesignação sexual, mas decidiu interromper o processo por insatisfação com os resultados, denominando-se desde então “neutro”. Em meio aos procedimentos para mudança de sexo, obteve a alteração em seus documentos para o sexo feminino, mas os médicos que examinaram Welby teriam concluído, em janeiro passado, ser impossível determinar seu sexo, quer seja fisicamente ou por seu comportamento. E um relatório da Comissão de Direitos Humanos da Austrália já tinha recomendado ao governo, em 2009, a lhe conceder a certidão de gênero não-específico. Na análise de Yone, esta seria a alternativa “mais objetiva para se resolver o problema da discriminação sexual e preconceito no Brasil, ao lado da criminalização da homofobia”. Para ela, a denominação “lésbica”, por exemplo, não é o suficiente para abarcar todas as identidades existentes entre as mulheres que se relacionam com mulheres. “Um rótulo jamais vai conseguir abranger e identificar o ser humano. Existem muito mais tipos de identidades e comportamentos do que se pensa por aí, um exemplo são as masculinidades femininas. Temos desde a mulher que usa roupa masculina porque gosta até a que usa para brincar com o machismo e seus estereótipos”, afirma. No entanto, enquanto decisão semelhante à australiana ainda não é possível no Brasil, a militante celebra o fato de, a cada dia, crescer no país a organização lésbica feminista na luta por políticas públicas que garantam igualdade e dignidade para este segmento da população. Nas mobilizações por direitos e cidadania, nas diversas conferências nacionais de políticas públicas, a presença e o protagonismo das lésbicas tem sido um fato reconhecido. Em 2008, durante a I Conferência Nacional LGBT, realizada em Brasília, optou-se por trazer a letra L (representativa do segmento de lésbicas) para a primeira posição na então sigla GLBT, que passou a se chamar LGBT. No entanto, segundo Yone, a visibilidade alcançada pelo segmento lésbico no Brasil nos últimos anos não tem a ver com a mudança de letras. “Pelo contrario. Esta foi uma briga inútil. Temos que nos unir nesta luta e não segmentar mais ainda. É preciso respeitar as nossas especificidades. É urgente que se garanta cidadania e implementação de políticas públicas que reconheçam as especificidades das mulheres lésbicas e bissexuais”, conclui. A data é comemorada em todo o país As manifestações na data acontecem em todas as regiões. No Rio de Janeiro, o Fórum de Lésbicas e Mulheres Bissexuais do Rio de Janeiro, a Superintendência de Direitos Individuais, Coletivos e Difusos (Superdir) e a Superintendência de Direitos da Mulher realizam, nos dias 27 e 28, o II Seminário Estadual de Lésbicas e Mulheres Bissexuais – “Unindo Esforços e Ampliando Conquistas”, no Auditório da Superdir (Prédio da Central do Brasil, 7º andar) e no Auditório do CEDIM (Rua Camerino, 51 – Centro), respectivamente. A programação encerra-se com a II Caminhada de Lésbicas e Mulheres Bissexuais “Lésbicas e mulheres bissexuais do RJ pelo fim de toda violência contra as mulheres”, com concentração a partir das 14h na Praia de Copacabana. A atividade é realizada pelo Fórum de Lésbicas e Mulheres Bissexuais do Estado do Rio de Janeiro. Em São Paulo, a Liga Brasileira de Lésbicas realizará a “Roda de Conversas: Visibilidade Lésbica em suas diferentes matizes”, no SindiSaúde (Rua Cardeal Arcoverde, 119, próximo ao metrô Clínicas), a partir das 14h. Veja a programação: Lesbianidade e Gênero – Tatiane Reis / UFRJ Publicada em: 26/08/2010 |