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Brasil
Contra monopólios indevidos
No dia 1º de dezembro, Dia Mundial de Luta Contra a Aids, o Grupo de Trabalho sobre Propriedade Intelectual (GTPI) da Rede Brasileira pela Integração dos Povos (REBRIP), coordenado pela Associação Brasileira Interdisciplinar de Aids (Abia) Associação Brasileira Interdisciplinar de Aids (ABIA), entrou com dois subsídios ao exame de pedidos de patentes de medicamentos para HIV/Aids dos laboratórios Abbott e Gilead, junto ao Instituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI). “A ação que estamos impetrando é uma forma de tentar evitar a concessão de patentes que não são justas e, portanto, não deveriam ser concedidas. Trata-se de uma estratégia que visa evitar a cessão de um privilégio que garante monopólios e que tem um impacto negativo importante sobre o acesso a medicamentos essenciais pelos pacientes brasileiros, em razão dos preços proibitivos cobrados no país pelas indústrias farmacêuticas”, explica a advogada Renata Reis. Reforçando a argumentação técnica proposta inicialmente pelo Instituto de Tecnologia em Fármacos (Farmanguinhos), da Fundação Oswaldo Cruz, os subsídios do GTPI sustentam argumentos técnicos e políticos para impedir a concessão da patente do Tenofovir, produzido pela Gilead, e para uma segunda tentativa de proteção do Lopinavir/Ritonavir (Kaletra), pedida pela Abbott. Os dois medicamentos fazem parte do conjunto de 17 drogas que compõem o protocolo de tratamento do Ministério da Saúde brasileiro. Cerca de 19 mil pacientes tomam o Tenofovir que custa, por paciente, US$ 1.387 ao ano. O Kaletra é usado por 23 mil pacientes, a um preço de US$ 1.379 por paciente ao ano. “Os pedidos de licença em questão não cumprem os requisitos de patenteabilidade exigidos pela legislação brasileira”, argumenta Renata. Em 1996, o Brasil alterou sua lei de Propriedade Industrial, incluindo em seus artigos 230 e 231 as chamadas patentes pipelines, uma disposição temporária por meio da qual foram aceitos depósitos de patentes em campos tecnológicos não reconhecidos até então, mesmo que tais pedidos já não cumprissem o requisito de novidade. Os depositantes tiveram um ano, pela nova lei, para depositar seus pedidos no Brasil. Entretanto, de acordo com um dispositivo do próprio sistema pipeline, o período de proteção de um medicamento produzido por um laboratório estrangeiro no Brasil inclui o tempo em vigor do primeiro depósito no exterior. No caso do Kaletra, o primeiro depósito foi feito nos Estados Unidos em 1995. Assim, no Brasil, o pedido de depósito de patente para este medicamento expira em 2015. Em 1999, a Abbott entrou com um pedido de divisão de patente. “É uma estratégia clara de estender o período de proteção e garantir o monopólio por mais alguns anos, impedindo a fabricação de genéricos a nível local, o que baratearia o custo com o tratamento”, diz a farmacêutica Gabriela Chaves, integrante do GTPI. “Não se pode vender como novo algo que não é” Um dos requisitos de patenteabilidade no Brasil diz respeito à inventividade da patente. Segundo o subsídio que o Grupo de Trabalho está apresentando junto ao INPI, o critério impossibilita a concessão de proteção patentária do Tenofovir à Gilead, uma vez que “a atividade antiviral do medicamento já havia sido comprovada em datas anteriores ao requerimento de prioridade por parte do laboratório”. O documento mostra, como evidências, referências à atividade antiviral da droga descritas em artigos publicados em 1993, 1995 e 1996, anteriores ao pedido de patente da Gilead. “O pedido de patente de invenção em questão não apresenta qualquer atividade inventiva. Este fato impossibilita a concessão da patente pretendida, uma vez que falta um dos requisitos estabelecidos pela Legislação de Propriedade Industrial (LPI) para a patenteabilidade de invenções. Não se pode vender como novo algo que não é"”, afirma Gabriela. Segundo a LPI, é patenteável a invenção que atenda aos requisitos de novidade, atividade inventiva e aplicação industrial. “Deste modo, uma invenção que não cumpra qualquer dos requisitos legais não é patenteável e o pedido de patente não pode ser deferido pelo INPI”, afirma Gabriela. “A Constituição Federal de 1988, ao estabelecer a proteção da propriedade intelectual, vincula o seu reconhecimento ao cumprimento de finalidades específicas, quais sejam, o interesse social e o desenvolvimento tecnológico e econômico do país”. Para a advogada Renata Reis, o INPI vem interpretando de forma desfavorável para a saúde pública os pedidos de patentes de medicamentos depositadas pelas empresas farmacêuticas internacionais. “Conceder patentes significa oferecer um monopólio durante 20 anos. Por essa razão, os pedidos merecem uma análise criteriosa da inventividade da patente e de outros requisitos de patenteabilidade. É evidente que a concessão de patentes no Brasil tem sido sempre favorável às empresas multinacionais e que patentes irregulares têm sido concedidas para produtos que não são invenções. A concessão deste tipo de patentes serve apenas para estender indevidamente monopólios, à custa dos pacientes e dos orçamentos públicos”, observa. Publicada em: 30/11/2006 |