TAGs
Traduzir
| |
Paraguay
O voto contra do anfitrião
Entre os dias 3 e 5 de junho acontece, em Assunção, capital do Paraguai, a 44ª Assembleia Ordinária da Organização dos Estados Americanos (OEA), sob o lema “Desenvolvimento com Inclusão Social”. Fruto de um consenso continental construído ao longo dos anos, um Projeto de Resolução sobre Promoção e proteção de Direitos Humanos será submetido a consideração da Plenária. Com o apoio da Argentina, Colômbia, Estados Unidos e Uruguai, o Brasil impulsiona a inclusão de uma série de menções sobre temáticas de orientação sexual e identidade ou expressão de gênero na Resolução a ser votada. O texto proposto exorta os estados membros da OEA a protegerem os direitos de lésbicas, gays, bissexuais, transexuais e pessoas intersex (LGTBI), fortalecerem os mecanismos de prevenção de violências e violações de seus direitos humanos e a adotarem políticas contra a discriminação. Na véspera da Assembleia, organizações locais de defesa dos direitos humanos entraram em alerta diante da mobilização de grupos religiosos e declarações públicas de parlamentares paraguaios que desvirtuavam o conteúdo do documento regional e promoviam discursos misóginos e de ódio contra as minorias sexuais. Por sua vez, membros do poder executivo e o próprio chanceler, Eladio Loizaga, anunciaram que o Paraguai não apoiará a resolução, dado que o país se absteve de assinar ou ratificar a Convenção Interamericana contra Toda forma de Discriminação. O chanceler foi além: afirmou ainda que no Paraguai não há homofobia e que, portanto, uma resolução do tipo não seria necessária. Na reunião com os embaixadores dos estados membros da OEA, realizada previamente à Assembleia Geral, outros setores da sociedade civil também se manifestaram, como o de mulheres, que demandaram pela elaboração e aprovação de Convenções Interamericanas de direitos sexuais e direitos reprodutivos, de afro-descendentes, de povos originários, de direitos humanos e democracia, entre outros. A crescente presença de grupos Pró-vida nestas reuniões provocou protestos e polarizou as posições motivadas pela recusa desta organização em discutir em conjunto e por sua disposição de impor uma versão excludente de família e contrária aos direitos humanos, segundo denunciaram alguns dos porta-vozes das organizações presentes. Ao final de sua intervenção, a ativista lésbica Camila Zavala pediu ao presidente do Paraguai, Horacio Cartes, para apoiar a Resolução sobre orientação sexual e identidade de gênero, em alusão às reticências de seu governo em apoiá-la este ano, como havia feito em anos anteriores. Nesta entrevista, as ativistas paraguaias Mirta Moragas Mereles, integrante da Red Contra Toda Forma de Discriminación – RCTD e Rosa María Posa Guinea, integrante do Grupo Aireana – Grupo por los Derechos de las Lesbianas, situam estes eventos no contexto político atual do país, dois anos após o impeachment do presidente Fernando Lugo e as eleições que levaram o conservador Horacio Cartes ao poder. Na América Latina, vários países têm avançado – em diferentes ritmos – na garantia dos direitos das pessoas LGBT em relação ao matrimônio, ao reconhecimento da identidade de gênero das pessoas trans e ao combate à violência. Como o Paraguai se posiciona neste panorama? Mirta Moragas - Países vizinhos, como Brasil, Argentina e Uruguai têm avançado muitíssimo no reconhecimento dos direitos das pessoas LGBTI. O Paraguai é o único país da região que não tem uma lei contra a discriminação, nem políticas públicas integrais sobre o tema. Atualmente não há sequer um mecanismo ao qual recorrer em casos de discriminação por qualquer motivo, incluindo a orientação sexual e a identidade de gênero. Não está claro qual é o órgão público que deveria reparar um fato como este, tanto no caso das pessoas LGBTI como dos indígenas, afro-descendentes, pessoas com deficiência e inclusive as mulheres. O tema dos direitos sexuais e reprodutivos também constitui uma dívida pendente. O aborto está criminalizado quase sem exceções – salvo em casos de risco de vida à mulher e problemas de saúde – e há muita discriminação, homofobia, transfobia e bifobia, assim como machismo. A sociedade paraguaia é muito conservadora e nos últimos anos tem havido um recrudescimento do fundamentalismo, mais forte e mais organizado. Quando surge uma questão mínima relacionada a avanços em direitos, estes grupos aparecem com força e têm uma grande capacidade de mobilização em alianças com igrejas. O Paraguai vinha acompanhando o processo prévio dentro da OEA para criar instrumentos contra a discriminação. O que aconteceu este ano? Rosa Posa - O Chanceler Eladio Loizaga já havia sinalizado previamente que não ia subscrever as convenções aprovadas em anos anteriores. No caso do Paraguai, como em outros países, para que o instrumento tenha força de lei, o presidente assina e o Parlamento ratifica. O nosso Parlamento discutiu uma carta enviada por grupos anti-direitos advogando por uma única forma de família e pela “defesa da vida” no marco da Assembleia. O senador Juan Manuel Bóveda fez declarações horríveis. Em anos anteriores, ele havia afirmado que os comunistas e os que advogavam pelo “matrimônio gay” queriam destruir o país. Depois o senador Carlos Nuñez Agüero afirmou que quando via um “homem disfarçado de mulher” na rua lhe gritava “escória da sociedade”. Por estas declarações, parecia até que se estava discutindo o matrimônio igualitário. Neste sentido, considero positivo o debate suscitado a respeito. Antes, quando havia declarações homo-lesbo-transfóbicas, as organizações sociais se pronunciavam. Mas agora foi tão terrível que muitos jornalistas criticaram esses parlamentares por seu nível de homofobia, o que tem gerado um debate bastante interessante na sociedade. De que modo os grupos conservadores se articularam a este debate? Rosa Posa - No marco da Assembleia Ordinária da OEA se estabelecem espaços para que a sociedade civil participe mediante a formação de grupos de trabalho sobre temas distintos e o produto deste trabalho é apresentado a todos os chanceleres. Isto é o que vai acontecer hoje [3 de junho de 2014]. Cada ano os participantes decidem que mesas vão se formar, mas este ano o governo paraguaio decidiu convocar uma mesa para os grupos autodenominados “pró-vida" e “pró-família”, o que suscitou uma discussão, uma vez que as mesas não são formadas por ideologias, mas sim por temas de trabalho, tais como desenvolvimento com inclusão social, LGBTI, direitos sexuais e direitos reprodutivos, mulheres, afro-descendentes. No entanto, esta mesa foi estabelecida de fato pelo governo. Mirta Moragas - Ao mesmo tempo, quando souberam do que a resolução iria tratar este ano, grupos opositores se organizaram para realizar marchas “a favor da vida e da família”. Tais grupos alegam inclusive que a Assembleia vai aprovar o aborto e o matrimônio igualitário. Eles têm feito uma forte campanha de desinformação em torno da Assembleia da OEA. Como interpretam declarações como as do Chanceler Loizaga, que disse que no Paraguai não há homofobia e, portanto, uma resolução neste sentido seria desnecessária? Rosa Posa - Nós, do grupo Aireana, enviamos uma nota ao Chanceler assinalando que negar a discriminação é uma das maiores demonstrações de que ela existe. Segundo nossas companheiras trans, desde 1989 elas têm sido vítimas de mais de 50 assassinatos. Em nossa organização, temos mais de 200 denúncias relacionadas a demissões trabalhistas, exclusão do sistema educacional, discriminação nas famílias, estupros de lésbicas pela polícia, prisões arbitrárias, maus tratos no sistema de saúde. A maioria dos casos são relatados por adolescentes e jovens e as agressões costumam acontecer dentro das famílias. Incluem violência física, psicológica, “estupros corretivos” contra lésbicas etc. Na carta, chamamos a atenção do Chanceler para o quão irresponsáveis eram suas afirmações diante deste panorama. Mirta Moragas - Através das declarações do Chanceler Loizaga, o governo endossou explicitamente a discriminação. Até agora, o Estado havia evitado abordar este tema. Em 2003, organizações da sociedade civil iniciaram a construção de um projeto de lei contra toda forma de discriminação, que foi apresentado em 2007. Já se passaram sete anos e o Parlamento ainda nem sequer o analisou. A posição do Estado havia sido de não tratar o tema; mas agora, o que ele está fazendo é incitar a discriminação, legitimá-la. E por experiência sabemos que quando fazem este tipo de coisas, quando os atores políticos legitimam a discriminação, isso repercute na vida das pessoas. Aqueles que cometem crimes de ódio se sentem legitimados por esse tipo de afirmação. Os que têm como diversão matar travestis ou golpear a homens gay ou mulheres lésbicas se sentem respaldados pelos atores políticos. O Paraguai se candidatou a integrar o Conselho de Direitos Humanos da ONU. No entanto, organizações sociais e redes que trabalham contra a discriminação e pelos direitos sexuais e reprodutivos manifestaram que um país que tem sérios problemas de discriminação e que não está disposto a assinar instrumentos orientados a combatê-la, não pode integrar um espaço como este. A agenda dos grupos mobilizados contra a resolução da OEA sobre orientação sexual e expressão de gênero e seu eco entre parlamentares voltou-se também contra os direitos das mulheres. Como interpreta esta virada conservadora que, a propósito, não é exclusivamente paraguaia? Rosa Posa - O senador Bóveda fez uma alusão à mulher como “uma cachorra fiel”, que deve esperar o marido em casa. De quem vem essa declaração, não é uma surpresa. Sabemos que a homofobia, a lesbofobia e a transfobia caminham de mãos dadas com a misoginia. Isto não é novidade alguma. A misoginia e o sexismo são parte de uma mesma família. Também se evidencia o racismo. Ontem [2 de junho], nas mesas de trabalho da Assembleia o representante de uma organização anti-direitos chamada Human Life International afirmou que no Paraguai não havia racismo, ao que uma pessoa afro-descendente replicou, assinalando que o racismo está no mundo todo. Parece que não tínhamos nos dado conta de que vivíamos no paraíso.
Leia também a Declaração da Coalizão de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis, Transexuais, Transgênero e Intersex das Américas: DECLARACIÓN DE LA COALICION DE LESBIANAS, GAYS, BISEXUALES, TRAVESTIS, TRANSEXUALES, TRANSGENERO E INTERSEX DE LAS AMERICAS ANTE LA ASAMBLEA GENERAL DE LA OEA. Asunción, Paraguay, 04 DE JUNIO DE 2014 Señor Secretario General, Señoras Ministras y Señores Ministros, integrantes de las delegaciones oficiales, colegas de la sociedad civil: Las organizaciones de lesbianas, gays, bisexuales, travestis, transexuales, transgénero e intersexuales, en adelante LGBTTTI reunidas en la Ciudad de Asunción, del 3 al 5 de junio de 2014 conforme a las directrices establecidas por la Asamblea General de la OEA que determinan un marco normativo para aumentar y fortalecer la participación de la Sociedad Civil en la OEA y en el proceso de Cumbres de las Américas, expresan que: El colectivo LGBTTTI saluda el que esta Asamblea tenga como tema central el Desarrollo con Inclusión Social, por entender que la exclusión por cualquier motivo produce efectos sociales y económicos indeseables que deben ser tomados en cuenta por los Estados. Los grupos sociales discriminados son marginados de los beneficios del desarrollo, presentan mayores niveles de pobreza y son más vulnerables a la violencia. Para que el desarrollo sea incluyente debe tener un enfoque de derechos humanos que tome en cuenta las especificidades de las poblaciones discriminadas, como son las personas LGBTTTI, las afrodescendientes, los pueblos indígenas, las personas con discapacidad, las trabajadores y trabajadores sexuales, las personas adultas mayores, las personas privadas de la libertad y otros grupos. La exclusión de una parte de la población de los beneficios del desarrollo no sólo viola sus derechos humanos sino que además empobrece el capital social de la nación en su conjunto. No puede haber desarrollo pleno cuando a las personas LGBTTTI se les margina del derecho a la educación, al trabajo, a la salud, a la justicia. El acoso y el bullying a niños y jóvenes gays, lesbianas y trans en las escuelas, cuando no su exclusión directa del sistema escolar, les niega las destrezas necesarias para su posterior inserción en el mundo laboral. Sumado a la discriminación en las contrataciones y los despidos arbitrarios debido a prejuicios homofóbicos, el resultado es que un gran número de ciudadanos y ciudadanas se ven impedidos de ejercer sus derechos en el ámbito laboral. La pobreza resultante es particularmente evidente en el caso de las personas transexuales y transgénero, que sufren la discriminación laboral en grado extremo, y en el de las lesbianas, cuya marginación es potenciada por el sexismo que las afecta como mujeres. La prevención y sanción de la discriminación laboral por motivo de orientación sexual e identidad de género son por tanto imprescindibles para el logro del desarrollo pleno. Los Estados deben adicionalmente poner en marcha políticas de acción afirmativa en la capacitación profesional y técnica de la población LGBTTTI, a fin de hacer más efectivas las políticas que buscan la incorporación de todos los grupos sociales a los planes de desarrollo. Otro ámbito de gran preocupación para la comunidad LGBTTTI es el de la seguridad ciudadana y la violencia, visto que América Latina y el Caribe sigue siendo la región del mundo con el mayor número de crímenes de odio. En la mayoría de los países de la región no se reconoce ni se sanciona la violencia motivada por la homofobia/ transfobia / lesbofobia, lo que aumenta la vulnerabilidad de este colectivo social y la impunidad. En el caso de las personas trans, la falta de reconocimiento legal de su identidad las coloca en una situación de inseguridad adicional que las expone a la violencia -incluyendo la cometida por la policía- y les impide al acceso a la justicia. Nuestro colectivo desea manifestar preocupación por la negativa de los Estados del CARICOM por invisibilizar a las personas LGBTTI y no asumir sus responsabilidades políticas. Además de afectar su dignidad y su calidad de vida, la falta de reconocimiento de los derechos ciudadanos de este sector promueve su marginación social y económica e impide su incorporación a los procesos de formación de capital humano indispensables para el desarrollo. Por otro lado, deseamos expresar a los Estados miembros nuestra agradecimiento por la adopción de la Convención Interamericana contra Toda Forma de Discriminación e Intolerancia y la Convención Interamericana contra el Racismo, la Discriminación Racial y Formas Conexas de Intolerancia. Exhortamos a todos los países de la región a adherirse a estas convenciones, demostrando de esta forma su compromiso con los derechos humanos de toda la ciudadanía, sin exclusiones. También expresamos a la Comisión Interamericana nuestra satisfacción por la creación de la Relatoría Sobre los Derechos de las Personas LGBTI. Así como rechazamos cualquier atentado contra la autonomía e independencia de la Comisión Interamericana. Expresamos por último nuestra desazón ante el discurso intolerante y de incitación al odio por parte de sectores fundamentalistas en Paraguay y en otros países de la región, incluyendo algunos altos funcionarios de los estados, que de manera abierta continúan oponiéndose al reconocimiento de derechos de las personas GLBTTTI incluidas en las resoluciones y convenciones aprobadas por este organismo. En virtud de lo anterior demandamos que los Estados Miembros: 1. Firmen, ratifiquen y ejecuten la Convención Interamericana contra Toda Forma de Discriminación e Intolerancia, así como la Convención Interamericana contra el Racismo, la Discriminación Racial, y Formas Conexas de Intolerancia. 2. Adopten legislaciones y políticas públicas conformes a los compromisos asumidos en las resoluciones sobre derechos humanos, orientación sexual e identidad de género aprobadas por las anteriores asambleas generales. 3. Adopten medidas que aseguren el acceso a la justicia, garanticen el debido proceso e impidan la impunidad, bajo los principios de no discriminación por orientación sexual e identidad de género. 4. Adopten estrategias de salud integral y específica para poblaciones LGBTTTI, con particular énfasis en las necesidades diferenciadas de las personas trans. 5. Revisen sus marcos legislativos, derogando leyes que criminalicen las relaciones entre personas del mismo sexo. 6. Adopten leyes que reconozcan la identidad de género de las personas trans. 7. Que se adopten leyes y se actualicen los cuerpos normativos para garantizar el reconocimiento de los difirentes tipos de familia. 8. Eliminen procedimientos médicos donde se sometan a mutilaciones genitales a niños y niñas intersex y elaboren protocolos basados en derechos humanos y respeto a la identidad de género. 9. Promuevan la participación directa de las personas LGBTTTI y grupos de la sociedad civil en los diálogos, consultas, definición y elaboración de los planes nacionales de desarrollo. 10. Que los estados del CARICOM, en los próximos dos años, definan políticas que respondan a las necesidades de los ciudadanos y ciudadanas LGBTI y mejoren los mecanismos en la planificación de las políticas estatales para que incluyan servicios para jovenes LGBTI. 11. Exhortamos a los Estados miembros a dotar de recursos financieros, en el marco del Decenio Internacional de los Afrodescendientes, para implementar acciones que garanticen su pleno desarrollo y la restitución de derechos de los hombres y mujeres LGBTI afrodescendientes de las américas. 12. Consideren la propuesta de una Convención Interamericana de Derechos Sexuales y Derechos Reproductivos. Que la Asamblea General: Apruebe el proyecto de Resolución "Derechos Humanos, Orientación Sexual e Identidad y Expresión de Género" presentada por la delegación de Brasil y los paises copatrocinantes, cuya iniciativa agradecemos. Publicada em: 04/06/2014 |