O CLAM se junta às organizações dos movimentos de mulheres, ONGs que trabalham no campo dos direitos reprodutivos e lideranças do movimento pelos direitos humanos, para manifestar seu repúdio às recentemente anunciadas modificações no texto do III Programa Nacional de Direitos Humanos (PNDH3) no trecho que trata da descriminalização do aborto em nosso país. Expressamos também nosso apoio ao Plano, assinado por ministros/as e pelo presidente Lula, em dezembro de 2009. Vale lembrar que, no documento original, o Programa se propõe a “apoiar a aprovação do projeto de lei que descriminaliza o aborto, considerando a autonomia das mulheres para decidirem sobre seus corpos”, e ainda recomenda ao Poder Legislativo a “adequação do Código Penal para a descriminalização do aborto”, além de garantir “seu cumprimento e facilidade de acesso” e “o alargamento dos permissivos para a prática do aborto legal, em conformidade com os compromissos assumidos pelo Estado brasileiro no marco da Plataforma de Ação de Pequim”. Em seguida, propõe-se também a “considerar o aborto como tema de saúde pública, com a garantia do acesso aos serviços de saúde para os casos previstos em lei”.
Agora, segundo declarações do ministro da Secretaria Especial de Direitos Humanos (SEDH), Paulo Vannuchi, já é decisão do governo alterar tais ações programáticas, três meses depois de assinado o Plano.
Na condição de uma das 66 organizações signatárias de carta eletrônica enviada ao ministro Paulo Vannuchi no dia 15 de março pelas Jornadas pelo Direito ao Aborto Legal e Seguro, ressaltamos que as alterações nestes trechos do texto não foram resultado de qualquer negociação com os movimentos sociais brasileiros, conforme sugerem notas divulgadas pela imprensa brasileira nos últimos dias. Entendemos que o III PNDH não é um documento construído somente pela Secretaria Especial de Direitos Humanos (SEDH), mas sim, fruto de 50 Conferências e, por isso, quaisquer alterações em seu texto deveriam ser discutidas coletivamente com os movimentos de direitos humanos e os setores do governo que participaram de sua construção e redação.
Portanto, defendemos a legitimidade do PNDH3 no que concerne aos direitos da mulher de decidir sobre uma gestação não desejada/não prevista. Entendemos que as atuais modificações afetam as condições de um país laico e expressam a posição do governo em ceder a pressões de setores religiosos, particularmente a da hierarquia da Igreja Católica, que mantém sua posição milenar de desrespeito à autonomia das mulheres em decidir sobre seus próprios corpos. Lembramos, entretanto, que reconhecer os direitos reprodutivos como direitos humanos foi uma conquista da humanidade. Ceder a pressões, desprezando os anos de luta das mulheres brasileiras e de setores progressistas no sentido de garantir condições dignas de procriação, significa um retrocesso por parte de nosso governo.
PEDIMOS RESPEITO AOS DIREITOS HUMANOS DAS MULHERES.
CENTRO LATINO-AMERICANO EM SEXUALIDADE E DIREITOS HUMANOS (CLAM/UERJ)