Dois processos relacionados à união de pessoas do mesmo sexo foram incluídos na pauta de julgamentos do Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) da próxima quarta-feira, 04 de maio. Os ministros deverão analisar a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 4277 e a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 132, ambas de relatoria do ministro Ayres Britto. A ADI 4277 foi interposta pela Procuradoria Geral da República em 2009 e requer o “reconhecimento, no Brasil da união entre pessoas do mesmo sexo, como entidade familiar, desde que atendidos os requisitos exigidos para a constituição da união estável entre homem e mulher; e (b) que os mesmos direitos e deveres dos companheiros nas uniões estáveis estendem-se aos companheiros nas uniões entre pessoas do mesmo sexo”. Já a ADPF 132 foi apresentada ao STF em fevereiro de 2008 pelo governador do estado do Rio de Janeiro, Sergio Cabral. A Ação pleiteia o reconhecimento de que o regime jurídico das uniões estáveis também deve se aplicar às uniões homoafetivas.
A Argüição de Descumprimento de Preceito Fundamental é um instrumento jurídico próprio para evitar ou reparar lesão a preceitos fundamentais contidos na constituição federal. No caso, a ADPF alega que, na medida em que o regime de união estável é negado aos casais homossexuais pelas decisões judiciais em todo o país, são violados os preceitos constitucionais da dignidade da pessoa humana (Art. 1º IV), da igualdade (Art. 5º) e o direito à liberdade (Art.5º, II). Através deste dispositivo, Cabral pede que seja declarado inconstitucional o Art. 1.723/CC, que dispõe sobre os requisitos da união estável, em especial a expressão "entre homem e mulher". A ação foi encaminhada para julgamento no dia 11 de março.
Nesta entrevista concedida ao CLAM, o governador conta o que o levou a apresentar a Ação e se diz otimista em relação ao resultado de sua apreciação pelos ministros do STF.
A ADPF 132 tem parecer favorável do ministro Ayres Britto, relator da ação. Qual a correlação de forças e a articulação entre os outros dez ministros do STF em relação à sua Arguição? O sr. acredita em uma vitória?
Estou bastante otimista quanto ao sucesso da nossa ação. Mas não cabe aqui prever cenários futuros. O Supremo é uma Corte plural e soberana. Estou acompanhando e torcendo, confiante de que a avaliação dos ministros será favorável ao nosso pleito.
Caso a ação seja aprovada, qual será o resultado prático desta decisão no que diz respeito ao estatuto das uniões entre pessoas do mesmo sexo? Ou seja, que questões poderão ser “resolvidas” depois do reconhecimento de que o regime jurídico das uniões estáveis também deva se aplicar às uniões homoafetivas?
Não sabemos ainda qual será o alcance da decisão do STF. Temos que aguardar a decisão. De qualquer maneira, se a nossa ação for considerada procedente, será um passo fundamental no reconhecimento das relações homoafetivas, uma vitória que é de toda a sociedade, para que tenhamos um país cada vez mais plural e democrático.
No Brasil , um projeto de lei de 1995 (PL 1.115), de autoria da deputada federal Marta Suplicy (PT/SP), visa a disciplinar a união civil entre pessoas do mesmo sexo. O referido projeto possui 18 artigos que objetivam, sobretudo, proteger os direitos à propriedade e à sucessão das pessoas do mesmo sexo que tiverem reconhecida a sua união civil. Passados mais de dez anos, o projeto nunca foi transformado em lei. Muitos acreditam que o Judiciário brasileiro, via pela qual o sr. preferiu percorrer, seja mais “avançado” que o Legislativo em relação a estes temas. Como o sr. avalia isto? Acredita que o Legislativo seja mais conservador?
Não creio que este ou aquele poder seja mais ou menos conservador do que o outro. Tradicionalmente, o Legislativo tem como característica o debate de ideias, já que representa os diferentes atores da nossa sociedade. E esse debate é sempre marcado pelas diferentes posições, pela pluralidade motivada por questões religiosas, políticas, sociais e regionais. Já o Judiciário trabalha, digamos, na “letra fria da lei” e procura interpretá-la da forma mais justa e equânime possível. Ambos os poderes são pilares da democracia e têm características distintas.
Em sua opinião, por que direitos já garantidos aos casais heterossexuais, como união estável, herança e adoção, ainda não são estendidos aos homossexuais no Brasil? Por que decidiu apresentar esta ação?
Decidimos apresentar esta Ação porque nosso governo reconhece e apoia a causa dos direitos dos homossexuais. No Rio de Janeiro avançamos muito nessa questão, através de uma legislação que garante a pensão aos companheiros homoafetivos dos servidores públicos. Além disso, a Secretaria Estadual de Assistência Social e Direitos Humanos tem o programa “Rio Sem Homofobia”, pioneiro em assegurar a cidadania ao movimento LGBT. Temos, nesta Secretaria, um núcleo de atendimento e um serviço telefônico (2334-9552 / 2334-9553) que permitem a denúncia de atos de violência e preconceito. E no dia 16 de maio, lançaremos uma campanha sem precedentes na história do Brasil: vamos estimular, por meio de peças publicitárias, o debate contra a intolerância. Portanto, as nossas iniciativas mostram que combatemos com firmeza qualquer ação de preconceito, em defesa da igualdade.