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Las tasas aún son altas

Muito pouco mudou em relação às taxas de mortalidade materna no Brasil, nas duas últimas décadas, apesar das iniciativas e programas realizados em 25 anos do Programa de Assistência Integral à Saúde da Mulher (PAISM). Segundo dados do Ministério da Saúde, foram 1623 mortes em 2006, pouco mais do que as 1520 registradas em 1996. Nesse intervalo de dez anos observou-se pequenas variações para cima e para baixo – em 1998, por exemplo, o número de óbitos chegou a 2042.

“Há o argumento de que a estagnação da curva da mortalidade materna no país possa ser atribuída, em parte, à melhoria no registro de óbitos ocorrida nos últimos anos. No passado, não havia notificação obrigatória”, afirma Margareth Arilha, diretora executiva da Comissão de Cidadania e Reprodução do Centro Brasileiro de Análise e Planejamento (CCR/CEBRAP/SP), organizadora do seminário “Mortalidade Materna e Direitos Humanos no Brasil”, realizado na semana passada em São Paulo, em função do dia 28 de maio – Dia Internacional de Ação pela Saúde da Mulher. “Tal argumento se deve ao fato de que todos os esforços para redução das mortes também implicaram em uma melhoria dos registros de óbito”, diz.

O seminário marcou os 20 anos da criação do primeiro serviço de aborto legal no país, em São Paulo, e também de um encontro entre feministas e profissionais de saúde para discutir o tema, o qual reuniu, além de Margareth, nomes como Elza Berquó e Maria José Araújo. “Depois de muito tempo houve novamente um momento de reflexão entre especialistas e sociedade civil, sem haver obrigatoriedade de uma interlocução com representantes governamentais”, lembra Margareth.

Segundo ela, de lá para cá o quadro também não apresenta mudanças em relação às estruturas de causas da mortalidade materna. No Brasil, a hipertensão é a primeira causa, seguida das hemorragias, da infecção puerperal e das doenças circulatórias. O abortamento aparece como a quinta maior causa. “Isso pode variar de país para país e até por estados. Na Bahia, a primeira causa é o abortamento”, revela a pesquisadora.

Questões como o acesso aos métodos contraceptivos, a capacitação dos profissionais de saúde e melhoria na qualidade dos serviços de emergência – especialmente dos bancos de sangue – foram levantadas. E também críticas à atenção/assistência do profissional de saúde no momento do parto. “Como colocou a Tânia Lago durante o seminário, a despeito da redução nas taxas de fertilidade – o que mostra que as mulheres estão se expondo menos – o sistema de saúde ainda não foi capaz de resolver seus próprios problemas. Houve um tempo em que se pensava que o acompanhamento de pré-natal era importante. Isso efetivamente ampliou-se, mas precisamos melhorar a capacitação dos profissionais de saúde não somente no pré-natal, mas principalmente na atenção ao parto”, avalia Margareth.

Questão de gênero e raça?

Os números da mortalidade materna no Brasil estão também associados às vulnerabilidades sociais dos grupos populacionais ou a uma assistência de saúde precária em todos os níveis sociais – as mortes também ocorrem em hospitais de classe média. Um novo estudo sobre a mortalidade de mães no país revela que o risco de morrer por aborto é muito maior nas mulheres negras e pardas do que em grávidas brancas, o que leva especialistas a questionar se a criminalização do procedimento no país estaria punindo apenas alguns grupos raciais. O trabalho, coordenado pelo médico Mário Monteiro, do Instituto de Medicina Social da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, foi apresentado durante o seminário. Segundo o estudo, o risco de morte de uma grávida negra cuja gestação terminou em aborto é 2,5 vezes maior do que o de grávidas brancas.

“Mais da metade dos números de mortalidade materna por abortamento até 2006 continuam sendo de mulheres negras. A lei arcaica para o abortamento acaba punindo, criminalizando e matando mulheres negras, população mais vulnerável”, revela a pesquisadora.

Segundo ela, quando se faz uma análise mais fina da problemática, percebe-se a necessidade de se olhar para questões como a vulnerabilidade das mulheres negras no país, a violência sexual e para a pedofilia. Segundo o Datasus, de 2000 a 2006 houve 200 mil partos de meninas de 10 a 14 anos e são registradas, anualmente, em torno de 16 mortes de meninas nessa faixa etária. Margareth lembra o caso do aborto da menina de 9 anos, depois de ter engravidado de gêmeos pelo padrasto, em Alagoinha (PE). “Na ocasião, a equipe do Centro Integrado de Saúde Amaury de Medeiros (CISAM) evitou uma morte materna (que não ia passar de mais um número), mas ainda desconhecemos em que condições outras meninas estão morrendo ou estão parindo em nosso país”, ressalta.

Margareth lembra que, nos tempos em que trabalhou na Organização das Nações Unidas (ONU), havia a idéia de que a mortalidade materna fosse um indicador da discriminação de gênero. “A idéia era de quanto menor as taxas de mortalidade materna possivelmente mais bem equacionadas estariam as questões de gênero naquele país”.

Segundo esclarece, a demora a que as mulheres são submetidas no serviço de saúde e também o tempo que a sociedade leva em analisar aquela morte e publicizá-la mostram tal discriminação. “Essas demoras estão marcadas pelo quanto a comunidade toma em consideração o sofrimento da mulher”, avalia.

Na análise da especialista, para mostrar a magnitude do problema não é necessário que os números aumentem. “As 1600 mortes no ano de 2006 representam cinco mortes por dia, e essas cinco mortes em cerca de cinco mil municípios parecem nada para os governantes. Mas apenas uma morte por abortamento já merece atenção”, finaliza.

No contexto latino-americano, as taxas do Brasil não estão entre as maiores nem entre as mais baixas. Em países como a Bolívia, um dos grandes problemas é a falta de estradas ou transporte, situação parecida com o Norte e Nordeste do Brasil. Cuba e Costa Rica apresentam os índices mais baixos de mortalidade materna, enquanto os andinos são tradicionalmente os que apresentam as taxas mais altas. No Brasil, atualmente há a exigência de que todo município apresente um comitê de morte materna. Em cerca de 90% dos municípios brasileiros já existem tais comitês.

Publicada em: 04/06/2009

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